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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Editorial da Folha faz, na prática, a defesa da impunidade para os criminosos do colarinho branco, incluindo os mensaleiros

A pressão da quadrilha do mensalão contra o Poder Judiciário começa a fazer frutos. Dia sim, dia também, condenados pela Justiça estão nos jornais difamando o STF, acusando-o de ter promovido um julgamento de exceção, apontando uma suposta mudança de jurisprudência nesse julgamento. Tudo absolutamente falso! A Folha faz hoje um editorial de suposto alcance geral, mas que, como diriam os ministros do Supremo, atendem ao “caso em espécie”: os interesses dos condenados do mensalão, que não querem, claro!, ir para a cadeia. Segundo o jornal, “penas de prisão deveriam, em tese, caber a criminosos violentos; para os demais, como no mensalão, conviriam severas penas alternativas”. Trata-se de uma aposta na impunidade que traz, também, uma marca de classe. Vamos lá. O editorial segue em vermelho. Comento em azul.
Para quem precisa
O título faz eco a uma música dos “Titãs”: “cadeia para quem precisa”. Não vou entrar no mérito das circunstâncias em que aquela canção veio a público. Noto apenas que é comum e humano que as pessoas que estejam enfrentando problemas com a lei acreditem que merecedores de punição sejam sempre os outros. Adiante.
Os crimes são cometidos mediante violência ou fraude. No primeiro caso, só resta à sociedade prender os infratores — são perigosos demais para continuar à solta. Será adequado tratar todos os demais do mesmo modo?
As primeiras linhas, que se pretendem neutras, como quem rememorasse o óbvio, já trazem, no entanto, uma escolha que requereria explicação: classifica de “perigosos demais” os criminosos que recorrem à violência, o que nos leva a pensar que os demais — os do colarinho branco, por exemplo — “perigosos” não são. Sendo assim, tem-se de saída que os crimes contra a ordem financeira, contra a gestão do estado, contra o patrimônio público e afins jamais devem levar seus autores para a cadeia. Os corruptos, no geral, são pessoas dóceis. Alguns podem até se dedicar à benemerência.
Esta Folha tem argumentado que não. Há mais de dez anos, portanto muito antes do mensalão, sustenta-se aqui que a pena de prisão deveria ser destinada, em tese, aos que recorrem a violência física ou grave ameaça na consecução do delito de que são culpados.
O fato de a Folha defender isso “há mais de dez anos” só nos diz que um equívoco pode durar mais de dez anos. Corruptos e corruptores, em regra, não recorrem a ameaças físicas. As “graves ameaças” que representam costumam dizer respeito à organização do estado. Segundo o modelo defendido pelo jornal, um Bernard Madoff estaria por aí (ou por lá…), solto, cumprindo alguma pena alternativa, podendo gozar, no dia a dia — e quem haveria de impedi-lo? — dos benefícios que hauriu de suas ações ilegais. Madoff ameaçava alguém, além do sistema financeiro americano?
As condições na maioria das cadeias brasileiras são abjetas. Mas a sociedade continua a abarrotá-las de indivíduos, condenados por juízes que fecham os olhos, como a efígie da Justiça, para a norma constitucional que proíbe “penas cruéis” e “tratamento degradante”.
Trata-se de um dos parágrafos mais infelizes, creio, jamais impressos nesse jornal. As condições das cadeias são, realmente, abjetas, com raras exceções. Trata-se de um argumento descabido porque nada tem a ver com o mérito. Não, Folha! Os juízes “não fecham os olhos”. É que eles não podem deixar de cumprir a lei. O editorial, afinal, defende a mudança do ordenamento jurídico vigente a respeito ou incita os magistrados a ignorá-lo? No que diz respeito à retórica, o editorial espanca tolamente a “efígie da Justiça”. Ela tem os olhos vendados, senhor editorialista, justamente para ser “justa”, para ser equilibrada, para não distinguir os que usam colarinho branco dos que usam macacão — para apelar a contrastes ora em voga no Brasil.
O editorial da Folha, infelizmente, defende uma Justiça sem venda, de olhos abertos, capaz, então, de discriminar quem será e quem não será punido independentemente do merecimento.
A Folha não deve ignorar, e certamente não ignora, que certos crimes são mais afeitos a determinados setores da sociedade. Há, como negar?, um traço de classe em algumas transgressões, não é? Os crimes violentos, que têm, sim!, de ser severamente punidos, costumam ser praticados — basta fazer uma pesquisa básica — por aqueles que não foram especialmente beneficiados pela sorte. Há exceções, mas é preciso olhar a regra. Já os crimes contra a ordem financeira e a gestão do estado, como a corrupção e a malversação do dinheiro público, são quase monopólio daqueles que viveram sem temor nem perigo.
A origem social tem forte influência NÃO NA DECISÃO DE DELINQUIR, MAS NO TIPO DE DELINQUÊNCIA. Um Fernandinho Beira-Mar, por sua origem, dificilmente, ocuparia o lugar de um Marcos Valério. Um Marcos Valério dificilmente se dedicaria ao ramo de Fernandinho Beira-Mar. Segundo a Folha, o primeiro representa um risco maior  para a sociedade do que o outro. Bem, eu não acho!
Eu estou entre aqueles que defendem que os dois devam ir para a cadeia — para boas cadeias, claro! E reitero que a corrupção generalizada responde por mais mortos do que os chefes dos morros. Matam crianças de fome, matam pobres por falta de assistência médica; soterram desvalidos, como se viu recentemente na região serrana do Rio.
São mais de 514 mil presos no país, num sistema que comporta 306 mil. Ao mesmo tempo, 153 mil mandados de prisão aguardam ser cumpridos, conforme o eufemismo judicial. Celerados estão livres, enquanto uma parcela de criminosos que não oferece o mesmo risco está detida.
Há falhas lógicas clamorosas nessa numeralha. Se a Folha considera que, entre os 514 mil presos, há os que não deveriam estar na cadeia, deve, da mesma sorte, considerar que, entre os 153 mil mandados não cumpridos, também há ordens de prisão descabidas. Fiz-me entender ou requer desenho? Logo, havendo presos demais, seguindo o jornal, também há ordens de prisão demais, segundo o mesmo jornal, de sorte que o número a ser cumprido, seguindo a lógica do articulista, seria menos relevante do que parece.
Juízo meramente comparativo não é juízo de mérito. Haver celerados soltos — e certamente os há — não muda a razão por que outros menos perigosos estão presos. Ou por outra: a periculosidade de quem está solto não muda a natureza do crime de quem está preso. O fato de o assassino de dez pessoas estar solto torna menos justa a prisão de quem matou um homem? Estar esse mesmo assassino na rua torna especialmente absurda a eventual prisão de quem assaltou os cofres públicos?
Dizer que a prisão deveria reeducar é outra falácia. Claro que é preciso aumentar o número de vagas nos presídios, torná-los compatíveis com um país civilizado e compelir os detentos a trabalhar. Mesmo na Suécia, porém, os cárceres fazem jus ao clichê de que toda prisão é uma universidade do crime.
O sentido do parágrafo é um só: as prisões são inúteis. Inúteis para quem? É bem possível que as cadeias realmente não recuperem ninguém. Mas espere aí, senhor editorialista: isso não vale também para os crimes de sangue, para os criminosos violentos? Não se prende um criminoso apenas para recuperá-lo. Há, sim, e tem de haver, o aspecto punitivo.
De resto, o texto acena para outra possibilidade perigosa. Se merece cadeia apenas aquele que ameaça a sociedade com ações violentas, que tratamento dar aos crimes passionais? O amante que mata o objeto de seu desejo (ou de seu ódio) porque traído ou algo assim deve ficar solto? Não raro, o que diz matar por amor não é um homicida compulsivo ou profissional. Dificilmente voltaria a delinquir. O marido que espanca reiteradamente a mulher não representa exatamente risco para a sociedade. No editorial da Folha, não cabe nem a Lei Maria da Penha.
Constatá-lo não implica complacência. Delinquentes violentos devem ser submetidos a longuíssima privação de liberdade, e a progressão dessas penas deveria ser até mais difícil do que é.
Na prática, o texto defende a exacerbação da punição para os que não têm colarinho branco e complacência, sim, para os que têm.
Quanto aos outros, não faltam medidas duras à disposição do juiz: impedimento duradouro de exercer cargo público ou determinada profissão, restituição dos valores subtraídos e prestação de serviços à comunidade, que podem se tornar encargos severos quando prolongados -e são verificáveis pelos recursos da tecnologia eletrônica.
Assaltantes dos cofres públicos, quando flagrados, no mais das vezes, já lavaram seus bens, já os colocaram em nome de terceiros, já enviaram dinheiro para contas secretas no exterior etc. Ainda que fossem condenados a dar sopão para pobres durante 10 anos, eles o fariam com a maior satisfação. Transfiramos Madoff para o Brasil e apliquemos os princípios da Folha… Nós lhe daríamos a chance de terminar os seus dias no conforto — ainda que tivesse todos os seus bens visíveis sequestrados — e ainda como um homem bom! Ele teria a chance de descobrir a graça de ser um homem generoso!
A indignação pública perante o escândalo do mensalão se expressa, contudo, no legítimo anseio de ver os culpados atrás das grades.
Não entendi. O anseio da população é legítimo, mas ignorante, é isso? Mandar mensaleiros para a cadeia é agora sentimento grosseiro dos bárbaros!
Sempre houve corrupção política, mas o governo Lula a praticou em escala sistêmica, sob o comando da camarilha então incrustada no ápice do Executivo e do partido que o controla. As punições hão de ser drásticas, e seu efeito, exemplar, mas sem a predisposição vingadora que parece governar certas decisões (e equívocos) do ministro Joaquim Barbosa.
A afirmação, feita assim, é irresponsável e só ecoa a acusação feita pelos mensaleitos, ora condenados. Por que o jornal não diz qual é a “predisposição vingadora” de Joaquim Barbosa? Por que o jornal não diz, então, quem foi condenado injustamente? Por que não detalha o que considera punição injusta? Eu já critiquei o ministro — ele e outros — algumas vezes. Mas nunca de modo genérico, sem deixar claro qual é o ponto que me incomoda. Parece que, nesse trecho, a Folha só faz uma profissão de fé no “isentismo”, para que os petistas, hoje críticos de Barbosa (que antes tanto louvavam), se sintam contemplados.
Tendo arrostado um partido que continua no poder e cujo chefe desfruta de imensa popularidade, seria decerto pedir demais ao Supremo Tribunal Federal que fosse ainda além, condenando nosso sistema prisional ao evitar que esses réus sejam despachados, sem motivo inarredável que não a letra da lei, para o inferno das cadeias.
Com a devida vênia, é o parágrafo mais intelectualmente malando do texto. O STF não arrostou ninguém, o PT tampouco. O STF aplicou a lei. Se isso implicou enfrentar os petistas e sua máquina de difamação — que agora faz eco até no editorial da Folha, na crítica genérica e sem objeto a Joaquim Barbosa —, eis uma consequência do cumprimento de sua função.
Os motivos que levarão alguns réus do mensalão à cadeia são “inarredáveis”, para ficar na expressão do editorialista, e estão conforme a lei, o Código Penal. Aliás, a comissão que elaborou uma proposta de reforma do texto torna ainda mais duras as penas contra os chamados crimes do colarinho branco. Ademais, não tema a Folha: boa parte dos réus tem curso universitário e desfrutará de condições especiais na prisão — o que não deixa de ser mais um odioso traço de discriminação de classe, não é mesmo?
Quanto ao inferno das cadeias, lutemos, sim, contra ele, sempre sabedores de que estamos lidando com duas ordens de problema: no mais das vezes, está lá quem deveria estar lá, mas não todos os que deveriam estar. E o estado lhes deve garantir condições salubres de vida. Mas de vida de recluso. Cadeia é, sim, punição!
Tal desfecho estaria sujeito a interpretações perniciosas. Ignorou-se a lei, tudo termina em pizza, diriam muitos. Evitou-se que os mensaleiros se façam de mártires encarcerados, diriam outros. Nem por isso a prisão desses criminosos terá sido necessária.
Por que não? Impressionante! Não há um só argumento ao longo do texto que explique por que “não terá sido necessária”. Há uma tese sem justificação: só deve ir para a cadeia quem comete crime violento. Ora, isso valeria, desde logo, como uma garantia para os corruptos e corruptores. Ficariam livres para assaltar os cofres públicos, para lavar o dinheiro, para colocar em nome de terceiros o fruto de seu roubo, para enviar dinheiro ao exterior etc… E ainda teriam a chance adicional de fazer caridade para compensar seus pecados…
Não há interpretação perniciosa possível para o editorial da Folha. Há a letra do texto. Trata-se da apologia da impunidade para os crimes do colarinho branco.
Por Reinaldo Azevedo em vejaonline.com

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Houston, temos um atraso

22 de outubro de 2012 | 7h 07

MÍRIAM , LEITÃO - O Estado de S.Paulo - ESTADÃO.COM
 
O contido pedido de socorro feito por astronautas, na iminência de uma catástrofe, celebrizado na frase "Houston, nós temos um problema", poderia ser enviado para Brasília quando o tema é educação e mercado de trabalho. O alerta a fazer é grave. Se não corrigirmos a rota vamos fracassar no projeto de desenvolvimento.
Os empresários dizem que não há trabalhadores qualificados, mas os jovens amargam números europeus de desemprego. Nas pessoas entre 18 e 24 anos, a taxa dos desocupados oscila entre 13% a 14%, mas no País se fala de pleno emprego. O recorte de gênero, cor e região levará a índices ainda piores. Uma pessoa negra, do sexo feminino e de Salvador enfrenta desemprego de 20%.
O estranho é que os mais jovens têm em média mais anos de estudo do que as faixas mais velhas da população. Portanto, não se pode dizer que o desemprego é decorrente apenas do problema educacional. Claro que temos uma crise grave na educação. É tão evidente que nem precisamos enviar recado para Houston, Marte ou Brasília.
A geração que tem hoje 45 a 50 anos estudou em média menos do que os que estão sendo barrados na porta do mercado de trabalho. Pode-se levantar a hipótese de que eles estão estudando o que o mercado não está procurando, e o mercado procura o que eles não estão estudando.
O descasamento entre oferta e demanda é parte do problema, mas não basta para explicar o enigma de um País que se queixa de escassez aguda de trabalhadores qualificados e onde o desemprego de mulher - que tem escolaridade maior do que a dos homens - é mais elevado.
O mercado de trabalho brasileiro prefere e pretere. E só faz isso, quem pode escolher e não está com escassez de oferta. As explicações dadas pelos especialistas e empresários não parecem suficientes. Existe no Brasil um agudo atraso na educação, mas isso não justifica tudo.
Há quem defenda a tese de que devemos dar aos jovens que querem ser trabalhadores técnicos apenas o conhecimento técnico. Reservando o ensino universitário para quem tem maiores ambições. Isso apressaria a formação da mão de obra requerida pelo mercado. Parece uma solução perfeita e ela tem um defeito: não conversa com o momento atual.
Tudo é mais desafiador hoje. Um trabalhador pode aprender de forma eficiente como dominar uma tecnologia que amanhã estará obsoleta. Imagine alguém que tenha se especializado na área de Tecnologia da Informação há dez anos e não tenha feito atualização nesse período. Ele hoje seria um jurássico, fora do mercado e sem emprego.
Mesmo se olharmos para trás, para um mundo mais simples que o nosso, aquele no qual um rapaz vindo de Pernambuco entrou no Sesi para se formar torneiro mecânico. No que aquele jovem foi realmente bom? Na liderança sindical e política que o levou à presidência da República.
O conhecimento se torna obsoleto com tanta rapidez que em vez de fazer a diferenciação entre ensino técnico e intelectual, o Brasil deveria estar pensando na qualidade do básico na educação que dará aos seus cidadãos a capacidade de pensar, escolher, comparar, raciocinar, divergir e, sobretudo, aprender.
Qualquer pessoa que estiver agora entrando no mercado de trabalho terá, ao longo das próximas décadas da sua vida profissional, de fazer várias mudanças radicais de áreas ou de formas de executar o trabalho. Não há um conhecimento que possa ser entregue como uma caixa mágica para o profissional de área alguma. Esse é o risco, e a delícia, de viver tempos revolucionários.
Mas Houston, ou Brasília, deveriam estar a essa altura curiosos para saber por que um mercado que se queixa de falta de mão de obra rejeita jovens que têm níveis de escolaridade mais altas do que as de gerações mais velhas.
Uma possibilidade é que as empresas não tenham entendido a parte que lhes cabe nesse esforço coletivo de preparação de trabalhadores. Só aceita quem já está pronto. Empresa moderna educa, qualifica, especializa, oferece cursos, treina os que recruta. Se as máquinas têm manutenção, por que as pessoas não? Na época em que vivemos os cérebros são o bem mais valioso de uma empresa.

O fim de um tabu

24 de outubro de 2012 | 3h 05

O Estado de S.Paulo - ESTADÃO.COM

A decisão da maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) de condenar 10 réus do mensalão também por formação de quadrilha não foi apenas coerente com o caminho percorrido pelos juízes, que ao longo de 39 sessões impuseram 70 sentenças condenatórias a 25 dos acusados de participar do escândalo, na linha da denúncia do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, endossada pelo relator do processo, ministro Joaquim Barbosa. Os 6 votos que prevaleceram em plenário na segunda-feira, entre os 10 ministros da Corte, quebraram um tabu e abriram a perspectiva de se transformar de forma substancial o combate à corrupção no País. O crime compensará menos, muito menos, e a chance de seus autores ficarem impunes, ou quase isso, finalmente começará a diminuir.
Variando de 1 a 3 anos de prisão, a pena por formação de quadrilha não se destaca pela severidade. No caso do delito de corrupção ativa, para comparar, o castigo começa com 2 anos e pode chegar a 12. Mas, somando-se à punição por esse e outros ilícitos, poderá fazer a diferença entre o seu cumprimento em regime semiaberto ou fechado. Além disso, e principalmente, o veredicto do STF priva os culpados do velho estratagema de alegar mera coautoria dos crimes cometidos, quando os seus protestos de inocência já tiverem sido desmontados pela força dos fatos conhecidos. Os principais mensaleiros, julgou o Supremo Tribunal, fizeram mais do que se acumpliciar para desviar recursos públicos - R$ 153 milhões, nos cálculos do presidente Carlos Ayres Britto - para favorecer o governo Lula na Câmara dos Deputados.
Assim como Britto, cinco de seus pares entenderam que os acusados formaram o que em direito se chama societas sceleris, uma organização delinquente estruturada e duradoura - no caso, sob inspiração, certamente, de Lula e efetivo comando do ministro José Dirceu - concebida para cometer crimes que podem ser sempre os mesmos, ou não. "Em mais de 44 anos de atuação na área jurídica", avaliou o decano da Corte, Celso de Mello, "nunca presenciei caso em que o delito de quadrilha se apresentasse tão nitidamente caracterizado." De seu lado, o ministro Luiz Fux ressaltou o "elo associativo", durando mais de dois anos, para a prática de crimes variados. "O conluio entre os réus não era transitório." Apenas se poderia especular sobre a sua longevidade e seus novos atentados à ordem republicana, se o esquema não tivesse sido denunciado em 2005.
Se a quadrilha continuasse apta a agir como vinha fazendo, por que à compra de votos de políticos não se seguiriam outras operações que golpeariam o Estado Democrático de Direito para o PT deitar raízes no poder? Não seria o presidente Lula quem iria impedi-la. Foi contundente, nesse sentido, o pronunciamento do ministro Marco Aurélio Mello. Ele lembrou apropriadamente o que dissera ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2006, quando criticou Lula por "enterrar a cabeça para deixar o vendaval (do mensalão) passar". Sem rebuços, notou que "mostraram-se os integrantes afinados, em número sintomático de 13", numa referência direta ao RG eleitoral do PT. "O entendimento se mostrou perfeito. A sintonia estaria a lembrar a máfia italiana."
Tentando tapar o sol com peneira, os petistas acusam o STF de "criminalizar a política", como se os arranjos entre os seus dirigentes e os de outras agremiações configurassem negociações legítimas para o fechamento de acordos de mútua conveniência, rotineiros nas relações entre os partidos e os governos de turno. Na realidade, mais de um ministro fez questão de apartar a política do lamaçal. "Não se está a incriminar a atividade política, mas a punir aqueles que não a exerceram com dignidade, preferindo transgredir as leis penais do País com o objetivo espúrio de controlar o próprio funcionamento do aparelho de Estado", ressalvou, por exemplo, Celso de Mello. "Não estamos a condenar políticos, mas autores de crimes." E o relator Joaquim Barbosa foi exemplar ao indicar o alcance da inculpação dos quadrilheiros de terno e gravata, cujos atos abalam a ordem social. "Ou só indivíduo que mora no morro e sai atirando loucamente é que abala?"

Quem vai devolver nossos milhões desviados?

25 de outubro de 2012 | 3h 07
 
O ESTADO DE SÃO PAULO - ESTADÃO.COM

Aloísio de Toledo César
Durante os debates no julgamento do mensalão ficou absolutamente claro que dinheiro nosso, arrecadado de impostos, foi desviado pelo governo Lula para encher os bolsos de políticos que se vendem, de banqueiros sem vergonha na cara e de empresários espertos em demasia. As condenações criminais em curso representam um alívio para a sociedade brasileira, mas falta, quem sabe, o principal: a devolução desses milhões, porque não se haverá de admitir que todo esse dinheiro tenha ido parar no bolso de pessoas desonestas e que elas não o devolverão aos cofres públicos.
Entre as pessoas que receberam a fortuna desviada, não se tem notícia de que nenhuma delas esteja vivendo com dificuldades financeiras, morando em casa alugada, com carnês vencidos, carro velho na oficina para consertar. As notícias divulgadas pela imprensa indicam exatamente o contrário, até mesmo que um deles, o número 2 da quadrilha, mora em condomínio de luxo na cidade de Vinhedo, possui escritório suntuoso no bairro mais caro de São Paulo e, enfim, nada tem que ver com aquele modesto servidor da Assembleia Legislativa.
Os brasileiros esperam que ocorra com essa turminha braba, marcada pela improbidade, o mesmo que está sendo feito há 30 anos com o hoje aliado dela, Paulo Maluf. Sim, Paulo Maluf, aliado de Lula, de José Dirceu e de todos os petistas, está em desvantagem e isso será injusto para ele caso os novos companheiros também não respondam patrimonialmente pelos crimes. A responsabilidade civil do administrador público é uma exigência imposta pela Constituição federal e, por isso, não constitui surpresa alguma que o Estado brasileiro use de todos os meios jurídicos possíveis para que Paulo Maluf devolva aos cofres públicos as quantias que o Ministério Público afirma terem sido por ele desviadas.
Não é possível que fato de muito maior relevância, que alcançou repercussão mundial, possa encerrar-se tão somente com as condenações dos envolvidos no mensalão. É necessário que todos sejam compelidos a devolver os valores irregularmente recebidos, bem como se impõe, por força da solidariedade em seu sentido jurídico, que o grande chefão também seja responsabilizado.
E não se fale em prescrição, porque os ilícitos por improbidade administrativa envolvendo dinheiro público são imprescritíveis, por disposição constitucional.
Haverá alguém neste país que acredite nas afirmações de Lula de que nada sabia dos desvios de dinheiros públicos (falou-se em R$ 350 milhões) cometidos debaixo do nariz dele? Seria possível que seus companheiros mais íntimos, Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, avançassem nesses dinheiros sem o aval do chefão supremo?
Dias atrás, na Argentina, Lula afirmou, em relação ao mensalão, que já foi julgado pela população nas eleições, porque se reelegeu e também elegeu a sucessora, motivo pelo qual disse não estar preocupado. Esse, realmente, foi um julgamento político, que envolveu em grande maioria pessoas insuficientemente informadas sobre a realidade do País, mas falta o julgamento pelo Judiciário.
O próprio fato de Lula dizer que já foi julgado, e absolvido, significa que ele se inclui entre os partícipes.
Em determinado momento, quando elaborava a denúncia referente aos integrantes do mensalão, o Ministério Público Federal deixou de incluir Lula na relação de denunciados, certamente pela circunstância de o presidente da República, com foro privilegiado, ter de ser denunciado perante a Câmara dos Deputados, que detém o poder privativo de conhecer ou não da denúncia, podendo arquivá-la. Agora, no entanto, o ex-presidente é um cidadão comum, sem foro privilegiado, e isso abre a possibilidade de que, sob o aspecto especificamente patrimonial, ele responda pelo vergonhoso crime que era cometido no Palácio do Planalto debaixo de seu nariz. Será que só Paulo Maluf merece esses processos?
Fora isso, vale lembrar ensinamento do ex-ministro do Supremo Paulo Brossard, quando dizia que não há democracia representativa sem eleição. "Mas só a eleição, ainda que isenta, não esgota a realidade democrática, pois, além de mediata ou imediatamente resultar de sufrágio popular, as autoridades designadas para exercitar o governo devem responder pelo uso que dele fizerem, uma vez que governo irresponsável, embora originário de eleição popular, pode ser tudo, menos governo democrático". Quando escreveu isso, parece que estava mirando a realidade presente, ou seja, o governo de um presidente que ainda não respondeu pelos ilícitos patrimoniais cometidos.
Ao assumir a Presidência da República, Lula jurou cumprir as leis e a Constituição, e não o fez. Se o fizesse, não permitiria que seus assessores mais próximos e mais íntimos avançassem impunemente sobre dinheiro público para gastar num vergonhoso plano político de manutenção do poder. Se houve tão somente omissão de sua parte, convém repetir que a própria Constituição desrespeitada exige o reembolso aos cofres públicos dos dinheiros desviados.
No pressuposto de que o presidente Lula tão somente soubesse dos delitos praticados, sem com eles se envolver diretamente, mesmo assim responderia criminalmente, porque o Código Penal, em seu artigo 320, estatui a figura da condescendência criminosa: "Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente; Pena - detenção, de 15 dias a 1 mês, ou multa".
Muito embora o artigo citado faça referência a funcionário, pacificou-se que se aplica aos agente públicos, aqueles que chegaram ao poder por eleição. Enfim, o agente que deixa de responsabilizar o faltoso e não promove a apuração de sua falta é alcançado pela norma.
* DESEMBARGADOR APOSENTADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
E-MAIL:
ALOISIO.PARANA@GMAIL.COM

Mudanças e permanências

21 de outubro de 2012 | 3h 07

O Estado de S.Paulo
São notáveis as mudanças ocorridas nos últimos anos no perfil da família brasileira, no papel da mulher no domicílio e no mercado de trabalho e na taxa de fecundidade, entre outros indicadores, mas o crescimento da economia não foi suficiente para eliminar velhas mazelas sociais típicas de países subdesenvolvidos, como a precariedade da moradia de quase metade dos brasileiros. Os dados do Censo 2010 divulgados pelo IBGE mostram um Brasil de contrastes, que melhora rapidamente em diversos aspectos, mas não consegue evitar a persistência de graves problemas, sobretudo entre as camadas mais pobres.
De 57 milhões de domicílios brasileiros, só 30 milhões, ou 52,5%, são considerados adequados, ou seja, não têm mais de dois moradores por dormitório e dispõem de abastecimento de água por rede pública, de coleta de esgoto sanitário por rede pública ou sistema de fossa sanitária e de coleta regular de lixo. Isso significa que são inadequados 27 milhões de domicílios, onde vivem quase 105 milhões de brasileiros. Além disso, cresceu o número de famílias que dividem suas moradias, indicador do déficit habitacional do País. Eram 6,5 milhões (13,9% do total) em 2000 e passaram para 8,3 milhões (15,4%) em 2010.
A situação já foi pior. Em 2000, nada menos do que 56,1% das moradias eram consideradas inadequadas. A melhora, porém, tem sido lenta, e os obstáculos institucionais, administrativos e financeiros à execução dos ambiciosos programas nacionais de saneamento básico e de recuperação urbana tendem a retardar a necessária mudança desse quadro.
Bem mais rápida tem sido a transformação do perfil das famílias. O número de mulheres chefes de família, por exemplo, dobrou entre o Censo de 2000 e o de 2010, passando de 9,048 milhões para 18,617 milhões. O Censo de 2010 contabilizou 49,9 milhões de chefes de família no País. As mulheres são 37,3% do total; dez anos antes, eram 22,6%.
Para o IBGE esse aumento reflete a maior presença das mulheres no mercado de trabalho e melhor escolaridade. Também a diminuição da taxa de fecundidade favorece o fortalecimento do papel da mulher na família. "A tendência é que esse cenário continue nos próximos anos", diz o técnico da área de população e indicadores do IBGE Gilson Gonçalves de Matos.
Há alguns aspectos dessa mudança, no entanto, que não são positivos. Estudos específicos sobre as mulheres chefes de família têm constatado que elas têm menos tempo de estudo e salários menores do que os homens que também são chefes de família. A renda do trabalho da mulher, não apenas das chefes de família, representa 70,4% da renda do trabalho do homem, de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad) de 2011.
O Censo de 2010 mostrou nova queda da taxa nacional de fecundidade, que chegou a 1,86 filho por mulher, a menor de toda a série do IBGE. Como a taxa de fecundidade necessária à reposição da população é de 2,1 filhos por mulher, a taxa nacional constatada pelo Censo indica que, a partir de 2030, a população brasileira começará a diminuir.
O Censo mostra um novo perfil das famílias. É crescente o número de uniões informais, de casais sem filhos e de casamentos inter-raciais. Cresce também o número de separações e de divórcios. Há também mais uniões consensuais, de casais que vivem sob alguma forma de união conjugal não formalizada nem no civil nem no religioso. Entre 2000 e 2010, esse tipo de união passou de 28,6% para 36,4% do total. Além de uma espécie de acordo de experiência antes da constituição da união formal, também a questão econômica estimula essa forma de união, que não requer gastos com festas. "Houve uma mudança cultural, iniciada pelos jovens", disse a pesquisadora do IBGE Ana Lúcia Saboia.
Em decorrência do aumento dos divórcios, tem aumentado também o número de famílias reconstituídas, com filhos só de pai, só de mãe e de ambos. O IBGE constatou a existência de 4,446 milhões de lares com esse tipo de formação familiar. Isso representa 16,3% dos lares de casais com filhos.

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,mudancas-e-permanencias-,948662,0.htm

Mitos do atraso

22 de outubro de 2012 | 13h29
José Paulo Kupfer
Os gargalos educacionais que afetam, desfavoravelmente, a competitividade da economia brasileira fazem parte daquele amplo rol de problemas complexos para os quais é possível listar uma série de soluções simples – e, em geral, totalmente equivocadas. É longa a lista de equívocos.
Resiste, bravamente, na cabeça de quem faz esse rol de diagnósticos equivocados, a ideia de que a qualidade da educação brasileira depende da concentração de esforços e recursos no ensino básico, em detrimento do ensino superior. Disseminada e repisada há décadas, a proposta não passa de um absurdo lógico. Como almejar mais qualidade na educação básica sem professores preparados para a tarefa num ensino de terceiro grau qualificado?
Eis aí um aspecto chave da complexidade do problema. Somente ações integradas, que contemplem a cadeia educacional como um todo, da creche à pós-graduação, darão conta do enorme desafio. No centro dessas ações, não exclusivamente, mas com importância crítica, está o professor. Sem resolver a complexa equação de como valorizar e atrair jovens para a profissão, difícil encontrar lugar para otimismo.
Nesse quesito, de fato, a situação não é animadora. Nossos professores do ensino fundamental estão entre os mais mal pagos do mundo e sua renda média não ultrapassa 90% da renda per capital nacional. Um claro contraste com os professores dos países ricos que fazem parte da OCDE, cuja remuneração média é 17% superior à média salarial geral, e anos-luz de distância da Coreia, onde o salário médio dos professores é mais do dobro da média nacional.
Não se trata, também diferentemente do que se costuma imaginar, apenas de uma questão de escassez de recursos. Os gastos brasileiros com educação não diferem muito do que é aplicado até mesmo em países desenvolvidos. Aqui são destinados 20% da renda per capita à educação de cada aluno do ensino fundamental, índice não tão distante dos 26% nos países da OCDE e acima do que gastam, por exemplo, Chile e México. A Coreia, o modelo educacional que todos gostariam de replicar, com 30% da renda per capita por aluno, é um ponto fora da curva.
São bem conhecidas as mazelas da educação brasileira. Mesmo nos aspectos quantitativos, em que os progressos são lentos, mas visíveis, lacunas imensas confirmam a profundidade do problema. Metade dos estudantes brasileiros, por exemplo, apresenta atraso escolar em relação à faixa etária e a evasão, em segmentos críticos como o dos adolescentes entre 15 e 17 anos, tem aumentado.
Nos aspectos qualitativos, o retrato que se revela também tem tons escuros. Os índices de analfabetismo funcional são alarmantes, alcançando inclusive pessoas com suposta formação superior. Na população entre 15 e 64 anos, um em cada três brasileiros apenas consegue ler e compreender mensagens simples ou realizar operações aritméticas rudimentares.
Apesar dos desarranjos e dificuldades, seria possível remover mais rapidamente as barreiras à melhoria da qualidade da educação brasileira com diagnósticos e ações menos distorcidas e cristalizadas. Para começar, quando se trata de pensar nos meios mais eficazes de ajustar a qualidade da formação de mão de obra às necessidades do mercado de trabalho, é comum cometer o equívoco de colocar toda a responsabilidade da superação do problema nos ombros do processo educacional, sem incluir no esforço o próprio mercado de trabalho.
Dos sempre citados casos de sucesso da Alemanha, do Japão e, sobretudo, da Coreia chegam lições genéricas e parciais acerca do alto grau de eficiência na aplicação de recursos em educação. Mas não é costume entre nós lembrar o protagonismo das empresas desses países modelares no processo de indução de formação profissional e absorção de trabalhadores qualificados.
Um elemento fundamental para o êxito dos sistemas educacionais desses países é o estreito vínculos existente entre empresas e escolas. Essa integração não nasceu da descoberta genial de algum sábio pedagógico, mas, simplesmente, de uma necessidade decorrente da crescente capacitação tecnológica do setor empresarial. Não custa lembrar, a propósito, que, no Brasil, os investimentos totais em P&D, década após década, mal passam de 1% do PIB, metade pelo menos bancada pelo governo, enquanto na invejada Coreia esses investimentos suplantam 3% do PIB, dos quais dois terços são de origem privada.
A baixa aplicação de recursos em P&D pelas empresas brasileiras reflete demanda limitada de mão de obra qualificada, e se desdobra na desconexão empresarial, salvo honrosíssimas exceções, do sistema educacional de formação profissional. Dessa combinação negativa resulta uma distorção, representada pelo grande contingente de egressos das escolas técnicas que buscam diplomas universitários.
Diante dessa realidade, não está errado bater na tecla de uma formação de nível médio com currículos desenhados para atender mais de perto às necessidades do mercado de trabalho. Mas apostar somente nisso todas as fichas da qualificação profissional parece ser mais um equívoco entre os muitos que contribuem para o atraso na superação desse crucial desafio brasileiro.

(Esta é a versão completa da coluna publicada na série especial “Desafios Brasileiros”, edição conjunta do “Estado” e do “Globo”, nesta segunda-feira, sobre o tema mercado de trabalho e educação).

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Nada de confundir alhos com bugalhos

24 de outubro de 2012 | 3h 05

José Nêumanne
Quando veio a lume a compra de votos para obter maioria no Congresso Nacional para o primeiro governo petista de Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira reação do ex-presidente foi dizer-se traído e apunhalado pelas costas por maus companheiros. E assumiu, como de hábito em sua vida, a postura do macaquinho que não ouve, não vê e não fala. Hoje se sabe que chegou a cogitar de renunciar e que teria sido dissuadido por seu lugar-tenente, o factótum José Dirceu, então chefe da Casa Civil, logo transformado em principal alvo do delator Roberto Jefferson. Este, especialista em salas, salões e corredores palacianos, preferiu evitar o confronto com o chefão. A oposição imaginou que, em vez de lutar por um improvável impeachment do presidente com maioria no Congresso, deveria deixá-lo sangrar até a eleição, quando lhe seria dado o golpe de misericórdia. Dirceu estava certo: Lula deu a volta por cima, venceu o tucano Geraldo Alckmin e, reforçado pela mística de invencível nas urnas, adotou a filustria do caixa 2.
Depois de oito anos no poder, na crista de uma onda de quase 80% de aprovação popular, o padim Ciço de Caetés deu-se ao luxo de impor uma candidata egressa do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Dilma Rousseff, que entrara no lugar de Dirceu no posto de "capitão do time". E, mais uma vez, consagrou-se nas urnas. Com sua empáfia característica, Lula, então, apostou seu cacife político na falácia de que o escândalo, apelidado de mensalão, foi uma fantasia da oposição despeitada, divulgada pelo Partido da Imprensa Golpista (PIG, porco em inglês), fantasma que na internet assombra o País nas mensagens dos "blogueiros progressistas". A explicação para o que havia sido revelado pelos fatos notórios seria um "crime menor", o caixa 2 de campanha. Para evitar que a realidade fosse revelada antes das eleições municipais, o próprio ex-presidente empreendeu uma cruzada tentando convencer ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) da necessidade de adiarem o julgamento, para não interferir na decisão do eleitor.
A ignorância inflou a empáfia e o ex-dirigente sindical viu a realidade desautorizar seu otimismo, baseado na evidência de que 8 dos 11 julgadores máximos foram alçados ao topo de sua carreira por presidentes correligionários dos réus mais importantes do processo, ele próprio e sua afilhada Dilma. Só que, ao contrário da Petrobrás e do Banco do Brasil, o STF não foi aparelhado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no poder. Nem poderia sê-lo, de vez que o Poder Judiciário é autônomo e entre os deveres dos membros de sua cúpula não consta a obediência ou a gratidão para amparar os interesses e a impunidade de um partido ou político que os haja nomeado para o lugar.
A vaga no STF é vitalícia e presidente nenhum de partido nenhum, com a maioria com que contar no Congresso, tem o poder de demitir um ministro do Supremo, ainda mais a pretexto de assegurar a absolvição de delinquentes. A condenação, por formação de quadrilha, do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, do ex-presidente nacional petista José Genoino e do tesoureiro Delúbio Soares, que sempre gozou de acesso privilegiado ao gabinete e ao coração do chefão, deixou claro que o Estado Democrático de Direito funciona no Brasil. E quem o conquistou na base de sangue, suor e lágrimas não se dispõe a liquidá-lo só para agradar a um líder adorado pelas massas e bajulado pelos parasitas que se refestelam à sombra e água fresca do poder.
Imune à condenação do STF, Lula agora sai a campo para usar o sufrágio popular como uma espécie de instância máxima, acima e além da Justiça, dando aos resultados nas urnas poderes, que não tem, de julgar o julgamento... e os julgadores. O raciocínio, de um simplismo absurdo, resulta da mistura de ignorância e esperteza que levou o Macunaíma da política brasileira ao auge da fortuna e da glória, mas que não absolveu nenhum réu nem ajudará nossa democracia a amadurecer.
Ao dizer a Cristina Kirchner que foi julgado pela população ao se reeleger, o Pedro Malasartes da gestão pública nacional deu seu poderoso aval à conclamação do principal réu do mensalão ao reagir ao resultado da eleição municipal em São Paulo, pregando: "A prioridade agora é ganhar o segundo turno". A cúpula do PT tentou adiar o julgamento e passou a campanha eleitoral inteira insistindo na tecla óbvia de que seu resultado não influiria na decisão do eleitor. O presidente nacional, Rui Falcão, disse que o povo estava ligado mesmo no novelão das 9, Avenida Brasil. Lula aproveitou para tirar um sarro dos palmeirenses, inimigos figadais de seu Corinthians e agora candidatos ao rebaixamento no Brasileirão. Gilberto Carvalho, homem de confiança do ex no gabinete da atual, disse que recorrer ao mensalão é dar um tiro no pé.
Hoje, com a visão utilitária de sindicalista cuidando do cofre da viúva, a cúpula petista tenta convencer a Nação a interpretar o veredicto das urnas em São Paulo como a vingança do mensalão. Mas qual o dispositivo constitucional que dá esse poder ao paulistano? Por que não adotar o mesmo critério em relação ao cidadão que votou no Recife, em Porto Alegre ou Belo Horizonte e derrotou os queridinhos de Lula e Dilma ainda no primeiro turno? O absurdo do raciocínio é tal que negá-lo parece desnecessário. Mas não é. Pois a democracia é imperfeita, como toda obra humana, mas essa imperfeição se reduz pelo equilíbrio de Poderes autônomos. O cidadão elege seus representantes para legislarem no Congresso e governantes para escolherem prioridades do interesse geral na gestão do dinheiro público arrecadado pelo Estado. Cabe ao Judiciário zelar pelo cumprimento da ordem jurídica e punir quem delinquir.
Essa democracia petista do venha a nós, ao vosso reino nada, não convém ao povo brasileiro, pois, ao confundir Jesus Cristo com Zé Buchudo (alhos com bugalhos) e tirar de sob o martelo do juiz a sardinha da punição, queima a mão de quem vota para beijar a mão de quem furta.
* JORNALISTA E ESCRITOR,  É EDITORIALISTA DO 'JORNAL DA TARDE'

  Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,nada-de-confundir-alhos-com-bugalhos-,949968,0.htm

A vitória do partido do 'mesmo'

23 de outubro de 2012 | 7h 08

Arnaldo Jabor - O Estado de S.Paulo
 
A história de minha vida política sempre oscilou entre dois sentimentos: esperança e desilusão. Cresci ouvindo duas teses divergentes: ou o Brasil era o país do futuro ou era uma zorra sem nome, um urubu caindo no abismo. Nessa encruzilhada, eu cresci. Além disso, dentro dessa dúvida havia outra: UDN ou PTB? Reacionários da "elite" ou o "povo"? Brigadeiro Eduardo Gomes ou Getúlio, "finesse" ou "sujeira"? Comecei a me interessar por política quando votei em Jânio. Confesso. Eu tinha 18 anos e não consegui me interessar por Lott, aquele general com cara de burro, pescoço duro. Jânio me fascinava com sua figura dramática, era uma caricatura vesga, cheia de caspa e dava a impressão de que ele, sim, era de esquerda, doidão, "off". Meses depois, estou no estribo de um bonde quando ouço: "Jânio tomou um porre e renunciou!" Foi minha primeira desilusão. Eleito esmagadoramente, largou o governo como se sai de um botequim. Ali, no estribo do bonde ‘Praia Vermelha’, eu entendi que havia uma grossa loucura brasileira rolando por baixo da política, mais forte que slogans e programas racionais. Percebi que existia uma ‘sub-história’ que nos dirigia para além das viradas políticas. Uma vocação, uma anomalia secular que faz as coisas ‘desacontecerem’, que criou ‘um país sob anestesia, mas sem cirurgia’, como diagnosticou Mário Henrique Simonsen.
Já na UNE, eu participei febrilmente da luta pela posse do vice João Goulart, que a direita queria impedir. O Exército do Sul, com Brizola à frente, garantiu a posse de Jango e botei na cabeça que, com militares ‘legalistas’ e heróis de esquerda, finalmente o Brasil ia ascender a seu grande futuro.
Nos dois anos seguintes, vivi a esperança de um paraíso vermelho que ia tomar o País todo, numa réplica da rumba socialista de Cuba, a revolução alegre e tropical que ia acabar com a miséria e instalar a cultura popular, a grande arte, a beleza, sem entraves, com o presidente Jango e sua linda mulher fundando a ‘Roma tropical’, como berrava Darcy Ribeiro em sua utopia. Um velho mundo ia cair sem resistência. Não haveria golpes, pois o ‘Exército é de classe média e portanto a favor do País’ – nos ensinava o PCB. Dá arrepios lembrar da assustadora ingenuidade política da hora. No dia 31 de março de 64, estou na UNE comemorando a 'vitória de tudo'.
Havia um show com Grande Otelo, Elza Soares, celebrando a ‘vitória do socialismo’. Um amigo me abraçou, gritando: "Vencemos o imperialismo norte-americano; agora, só falta a burguesia nacional!" Horas depois, a UNE pegava fogo e eu pulava pelos fundos sob os tiros das brigadas juvenis de direita. No dia seguinte, diante de mim, materializou-se a figura absurda de Castelo Branco, como um ET verde-oliva. Acho que virei adulto naquela manhã, com a UNE em fogo, com os tanques tomando as ruas. Eu acordara de um sonho para um pesadelo.
No entanto, os tristes dias militares de Castelo ainda tinham um gosto democrático mínimo, que até serviu para virilizar nossa luta política. Agora, o inimigo tinha rosto e uniforme e contra ele se organizou uma resistência cultural rica e fértil, que se refinou pelo trauma e que perdeu o esquematismo ingênuo pré-64. As ideias e as artes se engrandeceram na maldição. Nossa impotência estimulou uma nova esperança. A partir daí, as passeatas foram enchendo as ruas, num movimento democrático que acreditava que os militares cederiam à pressão das multidões. Era ilusão.
Ventava muito em Ipanema, dezembro de 68, enquanto o ministro Gama e Silva lia o texto do Ato Institucional 5 na TV, virando o País num sinistro campo de concentração. Com uma canetada, o Costa e Silva, com sua cara de burro, instado pela louca ‘lady MacBrega Yolanda’, fechou o País por mais 15 anos. Esperança. Desilusão. Vieram os batalhões suicidas das guerrilhas urbanas. Nos anos do milagre brasileiro, os jovens românticos ou foram massacrados à bala ou caíram no desespero da contracultura mística, enquanto os mais caretas enchiam o rabo de dinheiro nos ‘milagres’ de São Paulo.
O bode durou 15 anos e a democracia virou uma obsessão. "Quando vier a liberdade, tudo estará bem!", dizíamos. Só pensávamos na democracia e ninguém reparou que ela foi voltando menos pelos comícios das Diretas e mais pelas duas crises do petróleo que criaram a recessão mundial, acabando com a grana que sustentava os militares no poder. Os milicos e a banca internacional nos devolveram a liberdade na hora de pagar a conta da dívida externa. Os militares queriam se livrar da batata quente da falência do Estado e entregaram-no aos paisanos eufóricos com a vitória de Tancredo. Nova esperança! Aí, veio um micróbio voando, entrou no intestino do Tancredo e mudou nossa história. E começou a grande desilusão. Com a volta da democracia, no período Sarney, tudo piora. Nossos velhos vícios reapareceram. Apavorado, vi que a democracia só existia de boca, não estava entranhada nas instituições que passaram a ser pilhadas pelos famintos corruptos e políticos que tomaram o poder – todos ‘nobres’ vítimas da ditadura. Daí para frente, só desilusão e dor: inflação a 80% ao mês (lembram?), o messianismo de Collor, montado no cavalo louco da República, vergonha e horror. Depois, nova esperança com o impeachment; depois, mais esperança com o Plano Real, vitória da razão reformista com FHC, logo depois do Brasil no tetra, céu azul, esperança sem inflação. Nunca acreditei tanto na vida.
Mas, hoje, estou aqui, com medo e com tristes pressentimentos. Dilma pode ser uma nova esperança, se criar uma ponte entre a teimosia regressista e uma modernização mais liberal. O problema é que, para além das ideologias, existe no Brasil a maldição do Mesmo, uma grande empada de detritos que clama pelo atraso. O maior inimigo do Brasil é a aliança entre uma ideologia 'de esquerda' e a oligarquia 'de direita' – como é hoje. Nem UDN nem PTB. Ganha sempre o Partido do Mesmo.


Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,a-vitoria-do-partido-do-mesmo,949614,0.htm

Será que coqnuistamos e vivemos realmente uma democracia?

Urna não é lavanderia

24 de outubro de 2012 

Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
A última sessão de votação sobre o mérito da denúncia do mensalão proporcionou um desfecho de precisão magistral contida na constatação do ministro Celso de Mello: "Estamos a condenar não atores ou agentes políticos, mas agentes de crimes".
Não foi um mero resultado de 6 a 4 pela condenação dos réus nem só a confirmação de que uma quadrilha tomou de assalto o aparelho de Estado atuando por dois anos e meio sob as vistas do então presidente Luiz Inácio da Silva.
Foi bem mais que isso: deu-se a indispensável separação entre a atividade política e o exercício da ilegalidade continuada. Por ora uma dissociação teórica, mas que servirá à melhoria das práticas pelo que encerra de exemplar.
O decano da Corte expressou-se mais uma vez didático. Deu às coisas os nomes que elas realmente têm. O processo que agora se encerra tratou de delinquência pura e simples, não julgou o exercício da política.
Se esta foi contaminada por aquela, mais que depressa é preciso sanear o ambiente. Em primeiro lugar não confundindo as duas, muito menos se justificando uma (a política) com a outra (a ilegalidade) como se houvesse aí uma relação de indissociável dependência.
Em outras palavras, não precisa ser assim, não deve ser assim e, se houver quem ainda insista que assim seja está consignado pelo Supremo Tribunal Federal: seus autores não esperem ser tratados como políticos, pois serão vistos como os meliantes que efetivamente são.
Criminosos comuns, passíveis de cumprir pena de prisão, comparados a mafiosos e a bandidos de facções que infestam as grandes cidades.
Pessoas que, daqui em diante, não terão como recorrer ao discurso de que as urnas os absolvem, pois, como disse o ministro Celso de Mello, "votações expressivas, embora significativas, não constituem causas para a extinção da punibilidade".
Na sessão do "fecho" do processo, destacaram-se também os ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Ayres Britto na exposição detalhada do caráter social e legalmente pernicioso da atuação desse tipo de quadrilha.
Celso de Mello, porém, foi ao ponto que ainda não havia sido esmiuçado ao dizer que urna não é lavanderia de ilícitos, voto não é indulto e eleição não torna ninguém imune às exigências do devido processo legal.
Prestação de contas. Sem pretender discutir o mérito da convicção de cada um, é de se registrar uma acentuada diferença entre os votos que absolveram e os que condenaram os réus por formação de quadrilha.
As absolvições foram rápidas - à velocidade de um relâmpago no caso do ministro Dias Toffoli - sem grandes argumentações, enquanto as condenações se escoraram em longas fundamentações doutrinárias, jurídicas, sociais e morais.

Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,urna-nao-e-lavanderia-,950012,0.htm


domingo, 14 de outubro de 2012

VIGARICE INTELECTUAL, TEU NOME É MARILENA CHAUI! OU: FALOU A CARMINHA DO LIXÃO ÉTICO DO PETISMO!

Um amigo me envia um link de um texto publicado no dia 29 do mês passado num troço chamado “Rede Brasil Atual”, que pertence à CUT. O e-mail vinha com uma pequena introdução: “Leia o que disse Marilena Chaui; a mulher endoidou de vez”. Desconfio da sanidade intelectual desta senhora desde quando eu era de esquerda. Assim, não achei que ela pudesse me surpreender. Mas não é que me surpreendeu? Não existe limite para a sua decadência. Quando você imagina que ela não pode ir mais baixo, desafiadora, ela o contraria: “Posso, sim! Quer ver?”. E mergulha de cabeça no esgoto do pensamento, da história e da ética. Antes que entre no mérito, uma breve memória pessoal.
No comecinho dos 80, tentávamos uma greve de professores e estudantes na USP. Numa reunião conjunta de lideranças, dona Chaui — por quem muitos babavam embevecidos; eu e alguns amigos trotskistas a considerávamos mistificadora e populista — mostrava-se mais radical do que os próprios alunos. Num dado momento, indignada com o reitor, disparou um “Vá pra puta que o pariu”. Como não havia temperatura que justificasse aquela manifestação, as palavras como que se materializaram, desfilando naquela sala do Departamento de Filosofia em busca de um contexto. Eu mesmo fiquei encabulado. E não por causa do palavrão. Mesmo quando da canhota, tinha minhas ortodoxias. Achava que, se era para alguém ali se comportar como idiota, que fosse ao menos um de nós, os estudantes… Em matéria de estupidez, Marilena preenche todos os espaços. Havia outra coisa que me deixava um pouco com o pé atrás: sua biografia na esquerda era inexistente até o comecinho dos 80, como aluna e como professora. Quando veio a abertura política e quando já se podia mandar alguém à puta que o pariu, ela se transformou numa extremista. Entenderam? Fim da memória. Vamos ao fato.
No dia 28, Marilena participou de um debate no comitê de uma tal Selma Rocha, candidata a vereadora pelo PT — não se elegeu. O tema era este: “A Política Conservadora na Cidade de São Paulo”. Chaui, cujo salário é pago pelos paulistas há muitos anos para que ensine filosofia, afirmou, segundo a página da CUT, que “os candidatos Celso Russomanno (PRB) e José Serra (PSDB) representam duas vertentes da direita paulista igualmente prejudiciais à democracia, à inclusão e à cidadania”. Entendi. Se eles são tudo isso, entendo que deveriam ser proibidos de se candidatar, não é mesmo? Onde já se viu haver candidatos “prejudiciais à democracia”?
Escreve ainda a Rede Brasil Atual:
“Ela [Marilena] define o candidato do PRB como herdeiro do populismo tradicional de São Paulo, na linhagem de Adhemar de Barros e Jânio Quadros.”
Entendi. Mas e Paulo Maluf, de quem Russomanno era aliado antes de migrar para o PRB? O deputado do PP é hoje aliado do PT, como sabemos. Ela falou a respeito. Informa o site:
“Para Marilena, o ex-governador Paulo Maluf, cujo partido (PP) está aliado ao PT não eleições paulistanas, não se enquadra na tradição política representada por Russomanno, mas na do ‘grande administrador’, que ela identifica com Prestes Maia (prefeito de São Paulo de maio de 1938 a novembro de 1945) e Faria Lima (prefeito de 1965 a 1969). ‘Afinal, Maluf sempre se apresentou como um engenheiro.’”
Que coisa!
É um novo marco na decadência intelectual desta senhora: virou lavanderia da reputação de Paulo Maluf. Oito dias antes dessa declaração de Marilena, a juíza Liliane Keyko Hioki, da 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, atendendo a um pedido do Ministério Público, dera prazo até o fim deste mês para o “engenheiro” Maluf devolver aos cofres da Prefeitura de São Paulo R$ 21,350 milhões. A sentença é consequência de uma ação de improbidade administrativa provocada, à época, por denúncia de… petistas, liderados então por José Eduardo Cardozo, atual ministro da Justiça. Hoje, são todos aliados de Maluf.
Tudo passou! Aquele era o Paulo Maluf inimigo. Como tal, o PT o acusava de ladrão, truculento, reacionário, direitista (eles acham essa palavra um xingamento), fascista etc. Agora o homem está com o PT e terá uma fatia da Prefeitura caso Haddad vença. Pronto! Desapareceu o Maluf inimigo da democracia e da moralidade. Agora, Marilena Chaui apertaria comovida a sua mão e indagaria: “Como vai, engenheiro, da tradição dos grandes administradores?”.
Vergonha?
Alguém poderia indagar: “Essa mulher não tem vergonha de falar essas coisas?”. Não! Esquerdistas da linhagem a que ela pertence não têm vergonha, só interesses. Se Maluf serve ao projeto de poder do partido, eles lavam a sua biografia e podem até canonizá-lo, a exemplo do que fizeram com José Sarney, transformado em herói e estadista por Lula. Marilena Chaui é a Carminha do lixão ético petista.
Não pensem que ela parou por aí, não! Esta senhora, como vocês sabem, é a verdadeira formuladora da tese de que o mensalão era uma tentativa de golpe contra o governo Lula. Em sua palestra, mandou ver, segundo o site que trouxe a notícia:
“De acordo com ela [Marilena], se a República é constituída de três Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, a atuação do STF ultrapassou o limite: ‘O fato de que o Poder Judiciário faça isso coloca em questão o que é a República. Alguém tem de erguer a voz e dizer que o Judiciário está fazendo com que a gente ponha em questão se este país é ou não uma República’”.
O “isso” a que ela se refere é o julgamento de petistas. Marilena acha que se trata de uma ameaça à República e propõe que alguém “erga a voz” contra ao Judiciário. Não é do balacobaco? Julgar petistas segundo todos os rigores da Constituição e das leis é, para a notável professora, um “golpe”. Já erguer a voz contra o Poder Judiciário deve ser exercício democrático…
Faz sentido, não é? A mulher que demoniza Serra como uma ameaça à democracia e insere o “engenheiro” Paulo Maluf na linhagem dos grandes administradores tem mais é de classificar de democracia a tentativa de golpe petista e de golpe o exercício da democracia.
Nem eu, que via com desconfiança aquela senhora meio destemperada no comecinho dos 80, imaginei que ela fosse morrer abraçada a Paulo Maluf. Tudo devidamente sopesado, é um fim justo para ambos.
Texto publicado originalmente às 5h07
Por Reinaldo Azevedo

Fonte: www.veja.com.br

sábado, 13 de outubro de 2012

Os marginais do poder.



MARCO ANTONIO VILLA - HISTORIADOR. É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS - O Estado de S.Paulo
 
Vivemos um tempo curioso, estranho. A refundação da República está ocorrendo e poucos se estão dando conta deste momento histórico. Momento histórico, sim. O Supremo Tribunal Federal (STF), simplesmente observando e cumprindo os dispositivos legais, está recolocando a República de pé. Mariana - símbolo da República Francesa e de tantas outras, e que orna nossos edifícios públicos, assim como nossas moedas - havia sido esquecida, desprezada. No célebre quadro de Eugène Delacroix, é ela que guia o povo rumo à conquista da liberdade. No Brasil, Mariana acabou se perdendo nos meandros da corrupção. Viu, desiludida, que estava até perdendo espaço na simbologia republicana, sendo substituída pela mala - a mala recheada de dinheiro furtado do erário.
Na condenação dos mensaleiros e da liderança petista, os votos dos ministros do STF têm a importância dos escritos dos propagandistas da República. Fica a impressão de que Silva Jardim, Saldanha Marinho, Júlio Ribeiro, Euclides da Cunha, Quintino Bocayuva, entre tantos outros, estão de volta. Como se o Manifesto Republicano de dezembro de 1870 estivesse sendo reescrito, ampliado e devidamente atualizado. Mas tudo de forma tranquila, sem exaltação ou grandes reuniões.
O ministro Celso de Mello, decano do STF, foi muito feliz quando considerou os mensaleiros marginais do poder. São marginais do poder, sim. Como disse o mesmo ministro, "estamos tratando de macrodelinquência governamental, da utilização abusiva, criminosa, do aparato governamental ou do aparato partidário por seus próprios dirigentes". E foi completado pelo presidente Carlos Ayres Brito, que definiu a ação do PT como "um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto". Foram palavras duras, mas precisas. Apontaram com crueza o significado destrutivo da estratégia de um partido que desejava tomar para si o aparelho de Estado de forma golpista, não pelas armas, mas usando o Tesouro como instrumento de convencimento, trocando as balas assassinas pelo dinheiro sujo.
A condenação por corrupção ativa da liderança petista - e por nove vezes - representaria, em qualquer país democrático, uma espécie de dobre de finados. Não há no Ocidente, na História recente, nenhum partido que tenha sido atingido tão duramente como foi o PT. O núcleo do partido foi considerado golpista, líder de "uma grande organização criminosa que se posiciona à sombra do poder", nas palavras do decano. E foi severamente condenado pelos ministros.
Mas, como se nada tivesse acontecido, como se o PT tivesse sido absolvido de todas as imputações, a presidente Dilma Rousseff, na quarta-feira, deslocou-se de Brasília a São Paulo, no horário do expediente, para, durante quatro horas, se reunir com Luiz Inácio Lula da Silva, simples cidadão e sem nenhum cargo partidário, tratando das eleições municipais. O leitor não leu mal. É isso mesmo: durante o horário de trabalho, com toda a estrutura da Presidência da República, ela veio a São Paulo ouvir piedosamente o oráculo de São Bernardo do Campo. É inacreditável, além de uma cruel ironia, diante das condenações pelo STF do núcleo duro do partido da presidente. Foi uma gigantesca demonstração de desprezo pela decisão da Suprema Corte. E ainda dizem que Dilma é mais "institucional" que Lula...
Com o tempo vão ficando mais nítidas as razões do ex-presidente para pressionar o STF a fim de que não corresse o julgamento. Afinal, ele sabia de todas as tratativas, conhecia detalhadamente o processo de mais de 50 mil páginas sem ter lido uma sequer. Conhecia porque foi o principal beneficiário de todas aquelas ações. E isso é rotineiramente esquecido. Afinal, o projeto continuísta de poder era para quem permanecer à frente do governo? A "sofisticada organização criminosa", nas palavras de Roberto Gurgel, o procurador-geral da República, foi criada para beneficiar qual presidente? Na reunião realizada em Brasília, em 2002, que levou à "compra" do Partido Liberal por R$ 10 milhões, Lula não estava presente? Estava. E quando disse - especialmente quando saiu da Presidência - que não existiu o mensalão, que tudo era uma farsa? E agora, com as decisões e condenações do STF, quem está mentindo? Lula considera o STF farsante? Quem é o farsante, ele ou os ministros da Suprema Corte?
Como bem apontou o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, o desprezo pelos valores republicanos chegou a tal ponto que ocorreram reuniões clandestinas no Palácio do Planalto. Isso mesmo, reuniões clandestinas. Desde que foi proclamada a República, passando pelas sedes do Executivo nacional no Rio de Janeiro (o Palácio do Itamaraty até 1897 e, depois, o Palácio do Catete até 1960), nunca na História deste país, como gosta de dizer o ex-presidente Lula, foram realizadas na sede do governo reuniões desse jaez, por aqueles que entendiam (e entendem) a política motivados "por práticas criminosas perpetradas à sombra do poder", nas felizes, oportunas e tristemente corretas palavras de Celso de Mello.
A presidente da República deveria dar alguma declaração sobre as condenações. Não dá para fingir que nada aconteceu. Afinal, são líderes do seu partido. José Dirceu, o "chefe da quadrilha", segundo Roberto Gurgel, quando transferiu a chefia da Casa Civil para ela, em 2005, chamou-a de "companheira de armas". Mas o silêncio ensurdecedor de Dilma é até compreensível. Faz parte da "ética" petista.
Triste é a omissão da oposição. Teme usar o mensalão na campanha eleitoral. Não consegue associar corrupção ao agravamento das condições de miséria da população mais pobre, como fez o ministro Luiz Fux num de seus votos. É oposição?

Fonte: Jornal o Estado de SP, coluna Opinião, Sábado, 13 de Outubro de 2012

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Ser ou Não ser, eis a questão!
Os 25% e uma possível consciência que surge.

Recentemente, após as eleições municipais, li uma matéria sobre uma pesquisa que informava que uma quantidade considerável de pessoas (eleitores) não votaram em nenhum dos candidatos do rol que possuiam para tal pleito do 1* turno, que perfazia performáticos 25% do total, e que muito provavelmente a maioria era das calsses B e C.

Fiquei intrigado, e resolvi fazer uma "pesquisa" com as pessoas de meu círculo de amizade, e realmente comprovei que era fato. Explico, conheço pessoas das classes A, B, C e D (levando em conta os parâmetros do IBGE, mesmo eu não curtindo muito esta estratificação), e por isto, por viverem realidades diversas, mas estarem iguais como eleitores (pelo menos na teoria), perguntei se votaram em um dos candidatos ou se não optaram por nenhum deles para galgar o posto máximo de governante municipal.

Interessante é explicitar que estes amigos estão espalhados pelo Brasil, RF, SP, RJ, BE, BH, e suas regiões metropolitanas, bem como ocorreu um fator de desdobramento indireto muito legal, ou seja, muitos dos amigos me disseram que vários de seus amigos também não queriam nenhum dos candidatos colocados para o pleito, o que tornou a pesquisa mais profunda (pelo menos para minhas leves expectativas estatístucas iniciais), e não parei de receber e-mails, de contatos pelo msn, redes sociais, etc, de pessoas que nem conhecia diretamente (e olha que nem fiz o levantamento via net), e após contabilizar tudo, cheguei aos dados:





















Vemos que as classes B e C realmente foram as que mais se destacaram nesta empreitada.

Após esta ratificação prática, resolvi fazer um leve exercício mental, e percebi que são vários fatores possíveis para que em diferentes cidades do país, com realidades e culturas diferentes, estas atitudes fossem semelhantes. Cito por exemplo o fato de estarmos vivendo uma "era" mais informativa, com mais acesso aos conteúdos outrora debatidos somente em uma pequena parcela da elite, ou seja, aqueles que de certo modo detinham o poder monetário e cultural.
Com a chegada e expansão da internet, muita coisa mudou, mas foi principalmente com a melhora (mesmo que tímida) na qualidade e no acesso à educação por mais tempo e aos que outrora estavam alienados totalmente, que as pessoas passaram a ter mais raciocínio crítico.
Lógico que em nosso país o acesso à educação de qualidade se perfaz, na imensa maioria dos locais, com o poder aquisitivo melhor, e este acesso foi em massa nos últimos anos, pois sabemos que houve uma certa mudança de pessoas na pirâmide sócio-economica brasileira. Não vamos discutir aqui, nem daria, os motivos gerais deste fenômeno de ascenção social, mas sim o que ele impactou no ideológico das pessoas quanto especialmente ao senso crítico eleitoral.
Nesta toada, rapidamente percebi que um dos principais propulsores das classes B e C foram as políticas "sociais" de distribuição de renda aos mais pobres (vista como eleitoreira e retirada com impacto sobre as classes B e C), e incentivos à classe A (que o diga aos empresários, banqueiros, mesmo estes reclamando o tempo todo).
O cidadão das classes B e C tem perfil arrojado, buscou sua ascenção com muito trabalho, e se arriscou neste mundo capitalista disfarçado de socialista. Logo, tem suas percepções mais bem forjadas culturalmente, e sabe que governantes "populistas" que travam seus ideários em ações com objetivos "excusos" para o povo, mas perfeitos para os políticos, onde ferramentas mais simplórias (como a de dar dinheiro sem dar condições de melhoria) que impactam outros cidadãos são muito utilizadas, em vez de administrarem bem suas cidades, estados, país.
Lógico que há várias outras nuances (até incito aos leitores que lancem mão delas), mas sabemos que em um país onde o contexto sócio-cultural que é imposto midiaticamente ao povo é o de esvaziamento cultural das massas, alienando-as das principais nuances que realmente deveriam forjar nossa sociedade - o povo sabe muito de novelas, reality shows, programas de culinária, programas de auditório, carnaval, futebol, mas pouquíssimo de sua história, política, economia, sem falar em português, matemática, ciências, etc.

Em conversa com um amigo Juiz Eleitoral, ele me disse que não acredita que de fato aqueles que não escolhem nenhum candidato ou que justificam o voto, exercem mesmo uma ação cívica responsável e propiciadora de melhoras na sociedade, e eu rapidamente tratei de discordar dele, retrucando com o simples raciocínio de que nesta "democracia eleitoral" disfarçada  de "nazismo de opção", onde somos obrigados a votar (mesmo não tendo ainda a maturidade social necessária para optarmos), e pior a votar em um número reduzido de candidatos escolhidos pelos partidos (que na maioria giram em torno de velhas oligarquias), se temos o direito constitucional de não optarmos por nenhum deles, também estamos votando (escolhendo), só que na nossa consciência.

Não estou aqui para fazer apologia a nada, nem afirmo que sou partidário desta ação, somente comento o que percebi e colhi na pesquisa, pois a isenção é importante para que todos possam apreciar sem levar em conta a dúvida se há tendências textuais, tanto que também verifiquei que um dos fatores das classes B e C terem tomado tais ações foi a atitude governamental de penalizar financeiramente estas classes para manter a política populista de distribuir dinheiro - a dor no bolso e a falta de incentivos para o crescimento importou muito. Nesta toada, percebemos que poderia ter ocorrido um movimento pautado na revolta por serem incomodados pelo governo de forma direta (o ser humano naturalmente ataca para se defender), e não uma simples ação cívica. Claro que mesmo com esta pauta inicial, o movimento cresceu e teve impulso pelo fato em muito de serem pessoas mais esclarecidas culturalmente (e favorecidas economicamente).

Estou curioso de que forma se comportarão neste segundo turno, e também como serão as escolhas daqueles que não optaram por nenhum dos dois candidatos que ficaram para este turno (mas optaram por outro no primeiro turno).

Escolher um candidato ou não, eis a dúvida, mas estes 25% surgem com uma nova ação que certamente modificará os parâmetros de nossa sociedade política.

Abraços, boa noite e comentem!!!

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