.Suzana Camargo - 20/08/2014
Quando o consumidor escolhe o café ou o suco de laranja na prateleira do supermercado, nem sempre presta atenção se aquele produto é ou não certificado. Pois deveria. Produtos com selo que garantem sua sustentabilidade contribuem para apreservação do meio ambiente.
O Parceiros do Planeta conversou com Mauricio Voivodic,secretário executivo do instituto, que falou sobre a importância de sistemas de certificação, os setores mais avançados na obtenção de selos e ainda, a necessidade da oferta de incentivos econômicos para o cumprimento do Código Florestal.
Quais têm sido as principais áreas de atuação do Imaflora?O foco do Imaflora é promover sustentabilidade nos setores florestal e agrícola, promovendo impactos positivos social e ambientalmente no setor. Entendemos esta sustentabilidade como desde melhores práticas de produção no campo até ao longo da cadeia produtiva.
Quais seriam estes impactos?Estamos preocupados com questões de redução de desmatamento e degradação, conservação do solo, água e remanescentes florestais, menor uso de agroquímicos. Na perspectiva social, nossa preocupação é com relação entre empreendimentos florestais e agrícolas com comunidades locais, povos indígenas e seus trabalhadores. Também trabalhamos para que a produção extrativista gere conservação e melhor qualidade de vida para populações locais.
Através de que abordagens o Imaflora tem promovido a sustentabilidade?A maneira pela qual somos mais conhecidos é através do sistema de certificação socioambiental, como o sistema FSC (Forest Stewardshipg Council) no setor florestal e a Rainforest Alliance no agrícola. Entendemos as certificações como incentivos econômicos, ou seja, ferramentas de mercado que diferenciam produtores que fazem bem feito. E esta diferença é comunicada aos compradores e consumidores do mercado através dos selos.
Que outras ferramentas, além da certificação, podem incentivar a preservação ambiental?Na área de comunidades tradicionais em reservas protegidas, trabalhamos com populações em terras indígenas, por exemplo, principalmente no Corredor do Xingu, no Pará. Ali não trabalhamos com a perspectiva de certificação, mas de apoiar, capacitar e fortalecer estas comunidades e seus processos produtivos e na comercialização de seus produtos. Utilizamos nosso expertise para que elas tenham melhores benefícios através de práticas de mercado. Um outro componente que usamos bastante é na área de geração de informação, pesquisa e conhecimento para alavancar políticas públicas. Fazemos isso de forma sistemática em várias áreas, como as de legislação florestal e mudanças climáticas.
Tem crescido a busca por certificação no Brasil?No geral a procura por sistema de certificação e produtos com selos que atestem sustentabilidade tem crescido continuamente há vários anos e agora está num momento de bastante demanda. Há poucos dias foi publicada uma pesquisa que diz que 30% dos consumidores no mundo procuram por selos de sustentabilidade nos produtos e utilizam isto para comprar. Nunca este índice foi tão alto. É um indício que o mercado por produtos com certificação está aumentando bastante. Mas o Brasil é um país muito mais fornecedor deste tipo de produto do que consumidor.
Quais seriam estes produtos certificados que o país fornece para o consumo internacional?
Café, suco de laranja, madeira tropical, papel e celulose. A maior parte disso é exportado para mercados mais exigentes, como o europeu, americano, australiano. O interesse do consumidor brasileiro tem crescido bem também, em alguns setores mais do que outros, mas este consumidor não é necessariamente o final.
Café, suco de laranja, madeira tropical, papel e celulose. A maior parte disso é exportado para mercados mais exigentes, como o europeu, americano, australiano. O interesse do consumidor brasileiro tem crescido bem também, em alguns setores mais do que outros, mas este consumidor não é necessariamente o final.
Então quem é este consumidor?Vou dar um exemplo. Gráficas, revistas e publicações são o setor que mais cresce em termos do uso do selo FSC. Se você olhar no editorial da maior parte dos livros e revistas, verá que são feitos e impressos com papel certificado. Isto não é uma exigência do consumidor final – o leitor, mas sim uma questão das gráficas e editoras preocupadas com esta questão e querendo passar a imagem da responsabilidade ambiental. Outro exemplo é da rede de supermercados Carrefour, que está vendendo em suas lojas carnes certificadas, com origem de sustentabilidade. Mostra, neste caso, a procura do consumidor pela certificação do alimento.
O crescimento na procura da certificação pelas empresas é reflexo de conscientização ambiental ou busca por maiores lucros?Acho que ambos. Mais e mais empresas do setor privado tem procurado se posicionar melhor em relação a questões ambientais como estratégia competitiva. Acredito que nunca é um separado do outro. Não há uma preocupação ambiental desprovida de interesse econômico, assim como a busca pelo lucro sempre se apoia numa maior conscientização sobre este tema. Cada vez mais os assuntos do meio ambiente se tornam importantes para a sociedade como um todo. Há a falta de água em São Paulo, que é manchete nos jornais todo dia, mudanças climáticas, desmatamento e por aí vai.
O que ainda falta para o setor público e privado terem maior responsabilidade sobre seu impacto no planeta?É importante fazer uma análise por setor, principalmente aqueles com os quais o Imaflora interage. O setor de plantações florestais – papel e celulose, investiu muito em tecnologia e profissionalização. Hoje praticamente 70% da floresta plantada é certificada. Então já avançou muito, do ponto de vista ambiental está equilibrado. Indo para outro extremo, a madeira tropical na Amazônia tem menos de 4% da produção certificada. É a madeira utilizada para fazer os telhados das nossa casas, na construção de estradas, prédios, loteamentos … Estima-se que algo em torno de 50 a 80% da madeira produzida naquela região seja ilegal e predatória. Este é um setor que ainda falta muito.
E o setor agropecuário?Em geral, ainda falta bastante, mas alguns produtos já avançaram muito mais que outros. 20% do café brasileiro já tem algum tipo de certificação. É bastante, 1/5 do café nacional tem um sistema de certificação anexado a ele. Mas na pecuária, quase nada é certificado. Estamos começando a discutir a certificação da carne. Temos um longo caminho pela frente. A realidade do setor agropecuário brasileiro é muito diversa: tem o melhor e o pior.
Deveria haver mais incentivos governamentais e pressão do mercado?Sim. Qual é hoje o incentivo econômico que o produtor recebe para se adequar aoCódigo Florestal? Eles são escassos. Os grandes compradores fazem diferença se o produtor desmata ou se cumpre o Código Florestal? A maior parte dos compradores não diferencia isso, não paga nenhum centavo a mais. Então quem paga um custo para fazer uma boa gestão da sua propriedade, compete com aquele que não faz nada. Este tipo de incentivo seria fundamental.
Como a certificação contribui para a conservação da vegetação nativa do Brasil?
A principal conclusão de um estudo com pesquisadores da USP e Unicamp que o Imaflora divulgou recentemente é que incentivos econômicos são muito importantes para o produtor rural, seja agrícola ou florestal, cumprir a lei e até ir além dela - no que se refere à conservação de remanescentes florestais. Ao comparar produtores certificados com aqueles não certificados deu para perceber que os primeiros estão cumprindo mais a lei e conservando mais suas florestas. Tornou-se um incentivo econômico para o produtor conservar. Isso é muito importante.
A principal conclusão de um estudo com pesquisadores da USP e Unicamp que o Imaflora divulgou recentemente é que incentivos econômicos são muito importantes para o produtor rural, seja agrícola ou florestal, cumprir a lei e até ir além dela - no que se refere à conservação de remanescentes florestais. Ao comparar produtores certificados com aqueles não certificados deu para perceber que os primeiros estão cumprindo mais a lei e conservando mais suas florestas. Tornou-se um incentivo econômico para o produtor conservar. Isso é muito importante.
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Foto: Anna Christina Oliveira/Creative Commons e Wanezza Soares
Extraído do Planeta sustentável online, acesso em 23ago14.
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